terça-feira, 15 de maio de 2007

Novela do Cotidiano (Cap. 3)

A História de Atanásia Gerardinha.Autoria: Márcio Roberto de Almeida.

O nome de Atanásia Gerardinha foi escolhido pelo seu pai como uma forma de homenagear uma das figuras mais inusitados da cidade, cujo estilo de vida e a popularidade nas ruas fez com que ela se tornasse uma personagem do folclore vivo ao longo de muitos anos. Seu nome era "Gerardinha, Casô?". Isso mesmo, com vírgula e ponto de interrogação no final.
Segundo se contava, "Casô?" teria tido uma juventude comum, como qualquer moça da sociedade local e teria gozado do respeito de boa parcela da sociedade. Entretanto, uma paixão mal resolvida teria sido o estopim de uma triste e decadente fase que duraria até o final de sua vida. Além do descontentamento com esse amor não correspondido ou, quem sabe, por causa dele, "Casô?" dedicara seus dias exclusivamente à promoção de intrigas, aos fuxicos e à bisbilhotice da vida alheia. Em consequência desse comportamento, o isolamento aconteceu naturalmente e os círculos que outrora frequentava passaram a hostilizá-la. Indignada e rebelada contra o mundo, assumiu definitivamente uma vida de rua, de mendicância solitária e revoltada contra o mundo e contra todos. Passou a vagar pelas ruas, sendo achincalhada por moleques que, muitas vezes, a apedrejavam.
Como que por uma ironia do destino, a sua quase homônima, Atanásia Geradinha, também trilhou por caminhos semelhantes, tendo seus dias de convívio social que, por sucessivas desgraças, se tornaram amargos e solitários. Apesar de criada em uma família de classe média e ter tido todas as oportunidades para estudar e preservar a sua dignidade, não quis encarar um destino de luta honrada e digna. Preferiu, ainda muito jovem, dedicar-se a um estilo de vida desprovido de compromissos morais, se deixando levar pelos apelos da ociosidade e dos relacionamentos espúrios. Já na adolescência teria causado muito desgosto ao pai, assim como causara vergonha aos irmãos. Ainda era uma adoescente quando envolveu-se com uma paixão sem futuro e o fracasso dessa relação, assim como no caso de sua homônima, "Casô", foi motivo de aumento de sua revolta e a desilusão a empurrou para o caminho caminho da irresponsabilidade e da falta de compromisso moral.

Contrariando a toda a família conseguiu induzir as circunstâncias de modo a se casar com o seu pretendido, o qual pouco tempo depois a abandonou e se mudou para outro estado. Porém, nessa ocasião já haviam nascido dois filhos do casal e, assim, Atanásia se viu uma mulher largada pelo marido e sem quaisquer condições sociais ou morais para criar as crianças...
Persistente em seu intuito desgovernado, Gerardinha resolveu apostar tudo o que lhe restava para tentar a restabelecer alguma relação com o ex-marido. Vendeu a única posse tida como herança e, abandonando os filhos, se mandou para a mesma cidade, na esperança de conquistar seu amor, que a essa altura, depois de tantas desilusões e desgostos, já não queria sequer vê-la.
Gerardinha não desistiu! Fixou residência nas proximidades, se envolveu com os parentes do ex-marido, tentando com isso se aproximar. Mas nada! Nada demoveu a decisão do rapaz, tamanho era o desgosto sofrido no passado.
Não restando mais alternativas, Gerardinha decidiu apelar para os supostos poderes sobrenaturais e, por intermédio e influência de uma amiga que conhecera na paradas de ônibus próximo à casa da ex-sogra, então passou a frequentar seitas satânicas, tendo como motivação inicial, o desejo de obter poderes para forçar a volta do marido. Contudo, quanto mais ela se envolvia nas feitiçarias e quanto mais se especializava nos terreiros de sua seita, mais o pretendido se afastava.

No entanto, tamanha era sua dedicação e a sua fé nas promessas dos charlatões de sua organização "religiosa" que decidiu se dedicar integralmente aos ofícios da sua nova seita, obedecendo com rigor todos os mandamentos ditados por aqueles dirigentes ritualísticos, em quem ela confiava acima de tudo e de todos. Assim, cada vez que um sucesso prometido se frustrava, ela assumia aquilo como um motivo para se dedicar mais e mais, submetendo-se sempre aos argumento de seus "líderes espirituais". Mal sabia ela que aqueles preparados "pastores" detinham o controle total do processo aliciatório e apenas a iludiam com sucessivas promessas, cada vez mais tentadoras.

A partir de certo ponto, tais promessas já não mais se restrigiam apenas a atrair seu pretendido que, segundo diziam, logo, logo se atiraria a seus pés, apaixonado e pedindo perdão. Novos pressupostos eram gradativamente inseridos nas promessas, assim como a conquista de imensas riquesas materiais, além de saúde eterna. Além disso, o seu envolvimento nos trabalhos "para o bem de Jesus", conforme diziam seus mestres, lhe traria grande poder por intermédio dos serviços cativos de um certo demônio chamado VME, por meio do qual ela poderia enfeitiçar e controlar a vida de quem quisesse no futuro. Assim, Gerardinha se dedicou ainda mais, tornando-se obreira subjugada e cativa das ritualísticas da seita, o que segundo seus conceitos recém-doutrinados, era uma grande honra para qualquer ser humano. Em contrapartida só lhe caberia dedicar serviços integralmente à "igreja" sem qualquer retribuição material, obviamente, além de compartilhar quaisquer rendimentos ou valores que viesse a ter sob seu controle.
Assim, Atanásia passou a ter como única e exclusiva atividade na vida, a busca de meios para exercer algum domínio sobrenatural satânico sobre as pessoas e, por meio desses poderes, punir aqueles que não lhe agradassem, dando vazão à sua revolta. Entretanto, os seus momentos de folga passaram a ser dedicados à fofoca especializada em ataques aos que, eventualmente tivessem sucesso na vida, provocando a sua crescente inveja doentia que lhe dominava a mente, tal como ficou demonstrado no seu diálogo com a amiga, confidente e mentora intelectual, Udália Nucrécia, visto no capítulo 1 (reveja clicando em http://marciocc3.blogspot.com/2007/05/novela-do-cotidiano-cap-1.html) e, ainda, a narrativa do capítulo 2 (reveja clicando em em http://marciocc3.blogspot.com/2007/05/novela-do-cotidiano-cap-2.html.)
[... Aguardem novos episódios...]

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