terça-feira, 15 de maio de 2007

Novela do Cotidiano (Cap. 4)

Uma verdadeira "Soap Opera" à brasileira.Autoria: Márcio Roberto de Almeida.
Udália Nucrécia e Atanásia Gerardinha continuam se articulando e buscando novas vítimas para atacarem. Por ocasião de uma temporada de veraneio em que alguns amigos e parentes estiveram na casa de Udália, esta enviou Gerardinha para se infiltrar entre os veranistas para, em seguida, lhe passar os relatórios diários. Essa prática é comum: todas as vezes que outras pessoas, especialmente parentes, passam temporadas na sua casa de veraneio, Udália oferece a Gerardinha o “direito” de se hospedar de graça mas, em troca, exige um acompanhamento rigoroso das atitudes dos hóspedes, especialmente no que se refere ao gasto de seu sabão que, ao contrário da iminente preciosidade demonstrada, não passa de sabão comum, desses usados por todo esse Brasil afora, em todas as faxinas e lavações de roupa suja. Vejam o diálogo abaixo, que aconteceu logo depois que o último grupo de veranistas foi embora. A conversa segue no mesmo estilo do que passou no Capítulo 1 (leia em http://marciocc3.blogspot.com/2007/05/novela-do-cotidiano-cap-1.html).

Nucrécia: Até que enfim o povo desocupou, né, querida! A faxineira me ligou horrorizada com a lambança que largaram lá... Ela disse que as roupas estavam todas sujas, podres, e que não tinha mais sabão! Gastaram todo meu sabão e ainda não lavaram as minhas roupas de cama e mesa que usaram...

Gerardinha: No dia que eu fui embora de lá, eu lavei tudo os meus lençóis, esfreguei meu banheiro até brilhar, deixei o quarto do jeito que eu peguei! Tudo lindo...

Nucrécia: Não fui eu que gastei o meu sabão... Além de não ter gastado, ainda pedi a eles que comprassem mais. Mas, pelo jeito, com certeza ninguém comprou, né...

Gerardinha: Então!... Querida! É isso mesmo. Eles gastaram um pacote inteirinho de sabão que tinha lá! Eu vi! Tava completo, cheinho quando eu saí de lá! Que absurdo! Num é possível!... Gastou tudo!

Nucrécia: Gastou, não!... Gastaram!.... O Povo, né!... Morro de ódio!

Gerardinha: Eu não sei como é que você agüenta!.. Esse povão, folgado! Gastaram também uma caixa inteira de amaciante seu!... Cheinha, que eu vi! Vê se pode!

Nucrécia: Os meninos e o povo que foi com o Acádio Vanderley lavaram roupa deles também lá, que eu vi... E ainda jogaram as toalhas no chão... Falta de linha... Aliás, as roupas particulares, todo mundo lavava com o meu sabão...

Gerardinha: Eu vi aquilo, mas a Igislena Aparícia é que foi a mais folgada! Sabe o que eu vi? Você nem vai acreditar!!

Nucrécia: O que?

Gerardinha: O Ajerlio Santa-Fé enchendo a boca de sementes e casca de uva e jogando lá embaixo! Eu xinguei ele tudo! Mandei parar, disse que aquilo era um absurdo, mas quem disse que adiantou?... Só pra implicar ele jogava mais ainda.

Nucrécia: E o “povo” (aqui se referindo aos pais de Ajerlio) tava tudo junto, assistindo e não falava nada?!... Ele não tem noção... É um louco..

Gerardinha: Eu falei com ele pra não fazer aquilo que você num gostava e ele não me obedeceu. Disse que tava jogando era na rua.

Nucrécia: São muito folgados..

Gerardinha: O pior é que não alcançava na rua! Eu vi tudo! Ela enchia a boca e cuspia... A maior nojeira.

Nucrécia: Lógico...É o que se pode esperar! Não têm educação...Não sei como ainda não me chamaram atenção lá no condomínio por causa desses atrevimentos...

Gerardinha: Ele ficava sentado na sacada e chupando uvas o tempo todo e jogando nas pessoas que passavam lá embaixo, na calçada...

Nucrécia: O condomínio ainda vai me dar problema....

Gerardinha: Pior ainda foi a Igislena Aparícia!... Você não viu Nada! Quáquáquáquá!... Ela estava danando com o moço que cuida do guarda sol! Dando a maior bronca!..

Nucrécia: Mas como?!... Magina!...Isso é um absurdo!... O que que ela pensa que é?!... Onde é que ela pensa que tava?!...

Gerardinha: Achei foi graça! Mas você precisava ver que pose! Como se fosse a dona, a chefona!... Foi o seguinte: estavam faltando umas cadeiras, aí eu fui lá embaixo, perto da portaria pra procurar. Fiquei andando por lá pra ver se ninguém tinha pego. Aí a Igislena chamou o moço e falou assim:
- Toma cuidado, você num conhece a dona disso aqui! Vai ficar muito brava com você!!! Aí ele falou assim:
- Mas se sumiu cadeira daqui eu não tenho culpa.

Nucrécia: Que absurdo! Será que eles, pelo menos, mandaram arrumar as minhas cadeiras que quebraram? Fiquei com ódio!... Nem vi e nem quero ver aquelas cadeiras quebradas! Ai, que ódio!...

Gerardinha: Nem sei, minha filha! Não devem ter arrumado é nadinha!

Nucrécia: Vou lá na semana que vem pra conferir minhas coisas, lavar as roupas, tentar dar um jeito na sujeira...

Gerardinha: Tadinha! Tenho muita pena de você, minha querida! Por isso, pelo menos da minha parte, eu lavei tudo, deixei tudo arrumado! Desliguei o ar do quarto que fiquei e até fechei a porta. Se estiver sujo de novo é porque eles devem ter tomado conta depois que eu saí... Será que foram pro meu quarto? Devem ter ido, e bagunçado tudo, né! O pior é qie a Igislena disse que não ia fazer faxina, tem base?!... Disse pra mim que você falou que a faxineira viria quando eles fossem embora. Por isso, não ia por a mão em nada.

Nucrécia: Tá bom, posso até ter comentado sobre a faxineira. Mas paciência, né! Gente que não tá acostumada com praia e nem a ficar na casa dos outros não tem cuidado nenhum mesmo.

Gerardinha: Eu não sei como eles deixaram lá! Sei que o Otenório Santa-Fé falava todo dia que ia embora, que ia embora... Mas não ia nada!... Ia só adiando, enrolando, enrolando...

Nucrécia: Se arrumaram alguma coisa na casa, pode até ser, mas não sobrou nada, nenhum produtos de limpeza, nem amaciante e, principalmente, meu sabão... Deram um desfalque nas minhas coisas...

Gerardinha: No final das contas, parece que ainda ficaram lá até sábado, será verdade? Você sabe que dia, afinal, eles desocuparam?

Nucrécia: Pois é, minha filha, ainda ficaram até sábado!

Gerardinha: Não acredito!... Mas mesmo que os meninos tenham lavado roupas (eu vi lá no dia em que eu sai), tinha um pacote inteiro sabão! Eu juro que vi! Jesus Sacramentado!... Como é que pode?! Com certeza gastaram depois que eu saí de lá, pois ainda tinha até amaciante - uma caixa cheinha!...
E as compras da Igislena?!... Você nem deve ter ficado sabendo, né? Tô doidinha pra te contar: Acredita que guardaram as compras e ninguém usou? Escondiam, minha filha, até no porta malas do carro na garagem, pra ninguém comer! Você acredita?!... Se comeram alguma coisa, só se foi depois que nós viemos embora! Quáquáquáquá!...

Nucrécia: Ah!... Tudo bem! Deixa eles. Eu já to acostumada com essa história! Mas, só que dessa vez eu liguei pra Igislena! Ah, sim! Liguei mesmo! Liguei pra ela hoje e disse que vou cobrar todos os meus produtos e cada barra de sabão minha que eles gastaram! Vai ter que me pagar... Ora! Veja só! As roupas que eles deixaram sujas lá, eu ainda vou ter que gastar mais uns dois pacotes do meu sabão pra lavar!... Eu não aceito isso!

Gerardinha: Mas, querida, se você quiser, eu posso comprar também, pelo menos um pacote de sabão pra você, pois fiquei lá e lavei as roupas de cama gastando do seu, né!..

Nucrécia: Não querida, você não precisa. Mas o povo deve ter lavado umas dez toalhas de banho, toalhas de mesa e pano de prato, além de todas as roupas das cama! Gastaram sabão demais! Um absurdo!... Todo o sabão que tinha lá foi gasto por eles! Tenho certeza disso! Ahá! Vão me pagar, com certeza...

Gerardinha: Bem, querida, você sabe que toda vez que eu vou lá, deixo tudo limpinho, brilhando, como você gosta e não gasto do seu sabão, né! Você sabe disso, não sabe?

Nucrécia: A gastança de sabão é tanto verdade que, que no dia que eu estive lá e lavei as toalhas tinha sabão. Mas, tudo bem... Deixa eles comigo...

Gerardinha: E o que a Igislena falou? Prometeu lavar as coisas, fazer faxina e comprar seu sabão pra repor o que gastou?

Nucrécia: Ah!... Quem disse, minha filha!? Promete nada, desconversa! Agora tem mais; a Ilmara Cássia disse que talvez venha no carnaval!.. Mas eu já disse prá ela que, se quiser vir, tem que pagar as despesas do mês! E ainda, as despesas de luz tem que ser dividida. Eu sei que antes de vir, tudo é uma beleza! Todo mundo promete mundos e fundos!...

Gerardinha: Mas é assim mesmo! O Acádio não tinha prometido pagar também? E daí, pagou? Veio com um monte de gente e cadê?!...

Nucrécia: O Acádio eu vou perdoar dessa vez porque ele me pediu desculpas... Veio com uma desculpa de que eu tinha falado que não precisava de produtos de limpeza e de sabão. Nada a ver, mas eu perdoei ele dessa vez!

Gerardinha: Mas ele disse que só não pagou porque veio mais gente! Que não ia pagar para o outro povo...

Nucrécia: Só que eu falei que precisava de produtos de limpeza e de sabão... E, mesmo se eu não tivesse falado todo mundo sabe que um monte de gente dentro de um apartamento,deixa tudo sujo e existe uma despesa muito grande para arrumar, pra limpar tudo, fazer faxina. Lógico que cada um tem que saber que é sua obrigação comprar produtos e fazer faxina.

Gerardinha: Não entendi o que a Ilmara falou? Quem vai pagar as despesas do mês? Não vai ser nós que ficamos lá, não, né??!

Nucrécia: Ela disse que quer me alugar o apartamento para o carnaval. Eu disse que vou pensar, mas já falei que a conta de Luz que tá lá vai ser dividida e que vai ter que limpar tudinho, fazer faxina e comprar sabão em pó... Só falei isso, por enquanto!...

Gerardinha: Uai, mas o Acádio tinha dito isso! Cadê!? Pagou?

Nucrécia: Pois é, minha filha! O caso é esse! Depois que passa, ninguém paga nada!... Mas pra Ilmara eu disse só que a conta vai ser dividida...

Gerardinha: Ah, bom.

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